quarta-feira, 14 de março de 2012

Nada sei


Nada sei, esse deveria ser o nome do blog, caso alguém não tivesse registrado antes. “Saber em parte” também funciona porque traduz aquilo que me vem à cabeça sobre o resultado da minha constante procura pelo saber.

Não sendo filósofo profissional me torno filósofo funcional pela constante curiosidade e tentativa de explicar as coisas. Algo que surge de uma ânsia quase infantil, do tipo colocar o dedo na tomada.

Do saber quero o prazer, inexplicável, de simplesmente descobrir e ir além. Conhecer e prosseguir conhecendo, porque hoje conheço em parte, mas um dia conhecerei por completo. Hoje, é saber em parte para na eternidade vir a saber no todo. Por isso, posso dizer que nada sei.

Há muito tempo me impressiona a figura de Sócrates e sua postura em relação à busca pelo conhecimento da verdade. Próximo de sua morte, condenado a beber veneno pelos magistrados de Atenas sob a acusação de corromper as mentes dos jovens aristocratas de então, Sócrates, como parte de sua defesa teria dito:

“Sei bem que não sou sábio, nem muito nem pouco: o que quer dizer, pois, afirmando que sou o mais sábio? Certo não mente, não é possível. E fiquei por muito tempo em dúvida sobre o que pudesse dizer; depois de grande fadiga resolvi buscar a significação do seguinte modo: Fui a um daqueles detentores da sabedoria, com a intenção de refutar, por meio dele, sem dúvida, o Oráculo, e, com tais provas, opor-lhe a minha resposta: Este é mais sábio que eu, enquanto tu dizias que eu sou o mais sábio. Examinando esse tal – não importa o nome, mas era, cidadãos atenienses, um dos políticos, este de quem eu experimentava essa impressão – e falando com ele, afigurou-se-me que esse homem parecia sábio a muitos outros e principalmente a si mesmo, mas não era sábio. Procurei demonstrar-lhe que ele parecia sábio sem o ser. Daí me veio o ódio dele e de muitos dos presentes. Então, pus-me a considerar, de mim para mim, que eu sou  mais sábio do que esse homem, pois que, ao contrário, nenhum de nós sabe nada de belo e bom, mas aquele homem acredita saber alguma coisa, sem sabê-la, enquanto eu, como não sei nada, também estou certo de não saber.”

Tendo sido considerado o mais sábio daquele tempo e sabendo que sabia muitas coisas, percebeu que, comparando-se aos outros que também eram considerados sábios, havia uma distinção entre ele e os demais. Aqueles não apenas eram sábios mas arrogantemente achavam que realmente o eram. Sócrates, no entanto, chegou à conclusão de que a sua busca pelo saber impunha também o conhecimento da limitação da apreensão deste saber diante do tamanho da realidade. Em sua finitude, e depois de muito saber, ele pôde expressar a humildade, alguns dirão modéstia irônica, de verdadeiramente não saber.

Curioso o fato de que Sócrates não deixou nada escrito. Mesmo o relato acima foi feito por Platão, um de seus discípulos, no texto Apologia. Ensinou e influenciou a muitos, incluindo a nossa sociedade ocidental contemporânea. Ele sequer ganhava para ensinar. Tendo herdado algum dinheiro, ensinava por prazer. Por estar livre das amarras e possíveis pressões de mandatários pôde exercer o ofício de mestre sem restrições. O que esperar de seus jovens discípulos que estavam sendo treinados a questionar na busca pelo conhecimento? Obviamente, por conta disso, foi acusado e, finalmente, pensaram os seus juízes, calado. Mas o saber libertador não se cala. Ele sempre rompe as fronteiras e estruturas porque procura expressar a verdade.

Aquele que não sabe, está pronto a dialogar e aprender. Aquele que sabe, não pode sequer conviver. Diálogo, por sinal, foi o método usado por Sócrates para ensinar. Melhor dizendo, o método socrático, que inclui a dialética, a maiêutica e outras técnicas, parte da premissa de que é necessário perguntar e comunitariamente tentar descobrir os caminhos da verdade.

O que hoje eu sei, é que nada sei. O que hoje eu sei, é que sei em parte. Por isso, me aventuro a continuar não sabendo.

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